Das gaspiadeiras de Vizela ao pescadores mexicanos

As apreensões de toneladas, as mega-operações como a desta semana no Porto, os episódios com as lanchas rápidas, enfim, faz lembrar a  descrição de La Bruyère sobre a  cidade dividida em pequenas  sociedades que são como outras tantas pequenas repúblicas. O problema é que o nosso olhar é atraído para as pequenas sociedades espectaculares, ficando de fora outras bem interessantes. E, parafraseando  o actual Presidente da República, do mundo semi-rural. Ora vejamos:

 

Mãe e filha lideravam a actividade criminosa a partir de casa onde tinham uma fábrica de calçado, na Rua Pereira Reis. Por sua vez, a amiga, cabeleireira em Guimarães, era consumidora e é suspeita de vender droga em Guimarães fornecida pelas amigas.

Segundo a Guarda Nacional Republicana (GNR), foi ainda desmantelado um "pequeno laboratório doméstico" e apreendidos mais de 240 mil euros.

11. 900 doses de MDMA e 2.940 doses de cocaína, 1/4 de milhão de euros. Um pequeno laboratório? Uma cozinha de apoio à churrasqueira. Fábrica de calçado em Vizela? Um anexo à casa principal ou um barracão perdido em nenhures. Marketing? A amiga cabeleireira.

Esta história é uma das tais pequenas sociedades, que são outras tantas pequenas repúblicas,  em que se divide a narco-cidade. Nesta não há toneladas, tiros disparados de carros, milhões de euros em sacos. No Minho verde e pardacento as pessoas executam o franchising com desenrascanço. Podia ser pior.

 

Muito pior? Por exemplo  quando os narcos fazem o caminho contrário. Ou seja, quando passam da coca ou do fentanil para produtos que a vossa mãe compra todas as semanas. No México, na Baja,  o pessoal do cartel de Sinaloa (Jalisco Nova Geração) toma conta de pequenas comunidades piscatórias e fábricas de processamento de peixe e marisco. De início compram acima do preço do mercado, depois passam a comprar abaixo do mínimo. Para exportar seguem o caminho habitual:

For high-value fish meat, scallops, or oysters requiring freezing, complex processing, and provenance and sanitary documents, the cartels bring the seafood to Mexican (and U.S.) government-certified processing plants. A refusal by a processing plant to accept seafood brought in by Mexican organized crime groups would lead to the plant being burned down or its employees or owners killed.

Se pensam que isto é novo estão enganados.  Durante a Lei Seca, que já aqui abordei várias vezes,  o dito crime organizado reinvestiu os ganhos em negócios legais. Por exemplo, a construção de milhares de bares e clubes supostamente dry empregou pedreiros, electricistas, porteiros, cozinheiros, fabricantes de tijolo etc. Os portos, sobretudo os que serviam a importação de álcool canadiano, acabaram controlados mesmo na parte legal do negócio.

A escala é hoje diferente, sem dúvida, mas a regra do jogo é a mesma.

 

 

 

 

publicado por FNV às 10:07 | link do post | comentar